quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Só muda o endereço

A rotina daqui segue como a daí. Os professores reclamam dos seus sálarios. Acham que o diretor não deveria ganhar bem mais já que são eles que ralam e fazem acontecer. Mas o chefe acha que seus empregados  deveriam se doar  e serem mais comprometidos. Tem fofoca no corredor e meninos aprontando.  Gente morrendo de sono na primeira aula e desculpas esfarrapadas para explicar a falta de lição de casa.
Em casa, Intan reclama que não tem tempo para ficar com a família. Reclama que o mercado tá caro, que a corrupção no governo é demais e que o marido chega muito tarde do trabalho. Domingo é dia de diversão em família, em casa, no parque, na praia, no rio.
Nas ruas, o transporte público é lotado, a fila do banco é desesperadora e a burocracia para renovar a carteira de identidade é de chorar. A vizinha reclama do amor não correspondido e do barulho da casa do lado também.
Entre nossas diferenças, eis  que no fundo  somos todos iguais. 
Os meninos daqui também se divertem.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Mamãe, aqui também tem barata

Sempre começo um tópico aqui e logo pulo para outro. Escolher um título para o post é sempre complicado. Tem tanta coisa diferente e tantos assuntos que eu fico perdida. Então fica assim, um monte de coisa  misturada, jogada no ar. Acho que você já percebeu e já até se acostumou, mas nunca é tarde para se explicar. Desculpa esfarrapada feita, agora vamos aos fatos.
Sou cegueta, tenho 4.5 de miopia e não vivo sem minha lente de contato. Trouxe algumas, mas achei melhor ir atrás de uma ótica para ver se achava aqui mais algumas, só para garantir. Cheguei na ótica, com minha habilidade linguística deixando a desejar e expliquei como pude o que queria. A vendedora tentou e conseguiu me entender. Ótimo, maravilha, fiquei me achando a poliglota. Ela foi então me mostrar onde estavam as lentes e quando vi, tinha uma super barata andando entre as caixas. Não sabia se avisava ou não, não queria que ela enfiasse a mão na barata. Então disse: “Hati hati” (ou seja, cuidado). Ela, com a expressão mais calma e natural possível, simplesmente espantou a barata com a mão e pegou a caixa. Dei um sorrisinho amarelo e agradeci, ela não tinha a marca que eu uso e eu não fiquei muito entusiasmada com a compra. Isso me fez lembrar mamma mia.
Minha mãe não suporta baratas, não é verdade, Zena? Ela me perguntou algumas vezes se aqui tinha muita. Sim, aqui tem muita barata nas ruas, nas lojas, no angkot. Mas este episódio foi sensacional, fiquei rindo sozinha depois, só pensando em como minha mãe reagiria. Ela teria dado um escândalo daqueles. Daí me peguei pensando no meu banheiro daqui.
Já descrevi as peripécias higiênicas algumas vezes, mas ainda não mencionei que  meu banheiro fica na cozinha. O banheiro tem uma parede que não vai até o teto e ele fica na cozinha e é lá no banheiro também que se lava a louça. Nunca tem água na torneira da pia, então a gente deixa uns baldes cheios no banheiro e é com esta água que se lava a louça e também a bunda...(desculpe-me pela falta de tato, mas é verdade). Agora imagine-se com dor de barriga no momento em que alguém está preparando a janta.

Ao mesmo tempo que falo tudo isso, tenho descoberto como é simples se acostumar com as mudanças. É assim que funciona aqui, então vamos que vamos. De alguma forma - que eu talvez não entenda por causa dos costumes em que cresci - dá certo, funciona, vive-se. Conto porque sei que lhe parece estranho, mas o seu certo aqui é errado, entende?


quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A mão direita, insetos e pesadelos

Preciso amarrar meu braço esquerdo nas costas, colar minha mão no bolso, ou tentar uma outra alternativa. O que não dá é continuar esquecendo que a mão esquerda é impura por aqui (não vamos esquecer que não tem papel higiênico no banheiro e o pessoal se lava com a mão esquerda – sem mais detalhes).
De vez em quando, entrego o dinheiro com a mão esquerda, entrego livros para as crianças, uso a mão para comer e demora alguns minutos para eu perceber que tem alguma coisa errada. Eles me olham com receio, não estendem a mão em retribuição...só daí eu percebo que tem alguma  esquisista. Sou devagar, eu sei.
Falando em mão direita, deixa eu mencionar o coitado do meu pé. Na minha pele não tem espaço em que não haja uma picada. Depois do infortúnio com o rato, minhas noites que seguiram aquele nojento episódio não foram fáceis. Eu estava com tanto medo que aparecesse um rato que esqueci completamente de passar repelente. Aqui tem muito pernilongo - demais no caso - e um dia sem repelente na hora que está escurecendo já é o suficiente. Agora o coitado do meu pé, também direito, está tomado...o resto do corpo também, mas sem comparação.
Mentaliza, mentaliza, Maria Isabel, nada de coceira, nada de coceira....
Espertinhos

domingo, 18 de setembro de 2011

A Tradicional Zona

Na escola em que estou  o estilo é bem tradicional: o professor fala e o aluno escuta, uniforme bem passado e sapatos pretos, carteiras enfileiradas, livro didático seguido a risca, nota e prova formal para tudo. Tento trazer uma coisa nova, mudar um pouco, mas é difícil quebrar o sistema, ainda mais em tão pouco tempo.  Além disso  sou a ‘bule’, como chamam estrangeiros aqui. Eu sou um caso a parte, quase um animal exótico e só agora, depois de duas semanas, as crianças estão começando a me ver como professora.



O mais engraçado de tudo isso é que quanto mais eles tentam ser “certinhos”, mais a bagunça impera. Para começo de conversa não existe planejamento a não ser o livro que já está mais do que ultrapassado. Os professores têm muito o que aprender (como todo mundo), mas como são vistos como os donos do saber nada fazem para melhorar. A falta de consistência faz tudo ficar ainda mais sem pé nem cabeça. O que sai de tudo isso é: as crianças são super sem noção, mais perdidas do que cego em tiroteio!

Então a minha meta é tentar convencer os professores a seguirem alguns passos que aprendi e tento seguir. Mesmo tendo muito mais experiência do que eu, eles me escutam e me respeitam. Apreciam a maioria das coisas que eu faço, mas não estão muito empolgados em renovar. O que acontece é que acabam pedindo para eu fazer tudo. Planejo e reviso as provas, programo aulas e atividades extras, lição de casa, corrijo,  participo das aulas, assisto os alunos com mais dificuldade e por aí vai.
Sempre tive um pé atrás com relação a comportamento em sala de aula. Acho super difícil encontrar a medida certa entre deixar os alunos relaxados e encorajados a aprender sempre e manter a ordem. Aqui eu sou quase um general. Eu ainda não consegui entender como eles são tão cheios de seguir o velho método de ensino e ao mesmo tempo tão acostumados com a bagunça das crianças. Sempre têm umas viajando na maionese, outras desenhando, outra que nem pegou o livro. Daí eu vou, de um em um, indignada, dizendo: “pega o caderno; abre na páginal tal; acorda menino; pára de brincar com a régua;  arruma isto aqui que tá errado...” E Eu vou dizendo com o tom de voz e com o corpo, já que a maioria não me entende direito.
Mas assim vai indo, devagar e sempre, como aquele passarinho tentando apagar o incêndio. Nunca me senti tão útil e ao mesmo tempo tão incapaz de mudar.
Eu tô adorando a experiência...e meus domingos então, nem se fale. Para relaxar vai a foto do meu domingo ao sol! Viva!
Sikuai, uma hora de barco de Padang. Assim fica fácil relaxar...

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Bicho escroto não saia do esgoto

Bom, acho que eu já comentei sobre os ratos daqui. Eles estão em toda parte, muito difícil um dia que eu não cruzo com um na rua. Esgoto a céu aberto, lixo na rua, isto que dá!
Estava aprendendo a me comportar em público, segurar o grito e manter a classe...até que estava conseguindo...até antes de ontem.
Eu estava na cama, quase dormindo (cama não, no meu colchão, durmo num colchão no chão...aqui em casa não tem cadeira, nem mesa, nem sofá, muito menos cama) quando um roedor nojento apareceu EM CIMA DO COLCHÃO! Do meu ladinho, andando correndo e pronto - eu fiz um escândalo. Gritei estridentemente, pulei, corri desesperada e daí claro o pessoal de casa acordou e todos foram até mim. Eu tava meio sem fôlego, sei lá o que me deu, eu simplesmente odeio rato, poxa vida! Sou corajosa para maioria das coisas, sou independente (não totalmente, porque ninguém faz tudo sozinho)...mas isto foi demais para mim.
Tive que dormir na sala, depois de beber água e voltar a meu estado normal que já não é dos mais normais. Coloquei uma ratoeira no quarto e na manhã seguinte tinham dois grudados lá...
Por favor ratos, não apareçam mais....fiquem lá na rua....mas se vocês não obedecerem, aí embaixo está meu plano infalível!

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Beauvoir se revira no túmulo

Quando cheguei em Padang fui recepcionada com uma mini reunião de boas vindas. A reunião foi mais ou menos assim: “Oi. Eu sou o vice presidente da organização e estou aqui para te informar sobre a cultura local. Você já está aqui há mais de um mês, então já deve estar acostumada...vou só te passar então uma lista com algumas instruções.”
A lista começou bizarra e terminou mais ainda e eu fiquei com aquela cara de nada só ouvindo. Tentando não me atentar muito aos detahes para não rir. Só mulheres recebem esta lista. Vamos a ela:

  •  Sexo livre não é permitido.
  •  Se estiver acompanhada apenas por um homem permanecer  em um espaço público.
  •   É proibido fumar, principalmente em público.
  •   Não é permitido ingerir bebida alcoólica.
  •   Usar sutiã.
  •  Não jogar absoventes sem cuidado e não mostrá-los em público.
  • Conversa sobre sexo é tabu.
  • Chegar em casa até as 21:00.
  • Informar a organização quando sair da cidade.
  • Usar roupas respeitosas que cubram o colo e o joelho.
A lista continua e vai longe, mas eu esqueci o resto. Na verdade parei de prestar atenção para não me irritar ainda mais. Deixei bem claro pela minha expressão facial que aquilo não fazia sentido. 
Feministas do Brasil e do mundo, uni-vos!


As reprimidas de Padang

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Um belo encontro

Renovei todas as minhas energias hoje. No meu dia de folga, encontrei o Rafa, meu velho amigo de infância aqui em Padang. Quem diria?
Ele foi até Mentawai Islands pegar umas ondas e na volta passou por Padang. Morador da Gold Coast, Austrália, surfistinha peruibense. Nos conhecemos desde sempre, mais de vinte anos, com lembranças que vão desde as férias em Flora Rica, a escola das freiras até o batizado da Júlia, do seu casamento e agora a notícia de que ele está prestes a se tornar papai.
Matraquei sem parar, com sede de português e de um ouvido amigo. Parece que fui para casa e voltei!

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O sol daqui não é o mesmo que o de lá

Ai que calor! O sol queima que só e acredito que a expressão “dá para fritar um ovo na testa” seja literal por estas bandas. Entre meio dia e quatro da tarde, eu respiro e suspiro sem parar. Eu estou acostumada com calor, mas este é severo demais.
Ainda tem o pequeno detalhe de ter que cobrir o corpo, o que me faz transpirar sempre.  Alé disso, Padang  é bem mais sujo que Malang.  O esgoto é a céu aberto e todos jogam o lixo no chão, pelo vidro do carro, sem pudor. Então o cheiro sobe e é aquela beleza. A praia que é tão bonita é tomada por lixo. É muito difícil encontrar um pedaço de areia que não esteja tomado. Os ratos fazem a festa.
Eu odeio este roedores com todas as minhas forças e é claro que eles cismam em aparecer bem na minha frente. Hoje mesmo, fui dar uma volta no final de tarde, aproveitar que tava chovendo e tomar um banho com água que vem de cima (lembre-se que aqui não tem chuveiro) e me aparece um inesperadamente.  Me  deparei com um gato com um rato amarrado com um cordão nas costas. O rato já morto, meio que só pele e osso. Vai saber quem  foi o infeliz que teve esta ideia sem noção.
Ainda bem que na escola é mais fresquinho. Tô adorando as aulas, mas trabalhando pra caramba. Então, vamos suar! Viva o desodorante!
Pôr do sol em Padang - Eu reclamo de ti, mas te admiro meu amigo. 

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A escola de Padang e outras novidades

Hoje foi meu primeiro dia na escola aqui em Padang. Tenho 21 aulas por semana e vou dar aula para quarta, quinta e sexta série. A escola é muçulmana e minha manhã começou com um longo discurso do headmaster e muita oração.
Fui introduzida para as crianças e todas elas - cada uma das 200 crianças - tiveram que me cumprimentar, o que significa beijar a minha mão. Eu sou a única que não usa véu e hoje fui informada que camisa não é o suficiente, preciso usar um lenço que cubra o colo por inteiro.
Por aqui não tem data show nem internet e cópia é muita cara. O planejamento é quase inexistente. Os professores entregam um cronograma no começo do ano, o diretor assina e é arquivado e acabou. Vou ter que me revirar em criatividade. As crianças quase não falam inglês, mas estão todas animadas com a minha chegada.
Eu também estou animada.
O bom é que depois de um dia de trabalho é só andar até a praia, ver o sol se por e pasmem - comer um milho e tomar uma garapa!

Detalhes:
1. A internet daqui é devagar quase parando, de irritar o mais calmo dos mortais. Então vou começar a postar com bem menos frequência.
2. No meu segundo dia por aqui, o vizinho me convidou pro casamento da prima e eu fui, claro. Aí embaixo está a prova do crime: eu e os noivos!

domingo, 4 de setembro de 2011

Padang, Indonésia parte 2.

Sumatra Island, here I am! Mais uma aventura começa.  Cheguei com um certo atraso e muita chuva num misto de ansiedade e saudosismo.
 Fiquei só por um mês em Malang, mas foi tão intenso que pareceu bem mais. Ontem tive minha última janta com o pessoal que me hospedou durante o projeto  que insistiram em dizer que agora eu tenho uma família por lá e que sentirão minha falta. Foi muito especial, estou ficando especialista em despedidas.
Depois de um pit stop em Jakarta, saí da ilha java para dar início ao meu segundo projeto. Dois organizadores foram me buscar no aeroporto de Padang e me levaram para a minha casa, onde vou ficar por dois meses. Minha host se chama Intan, casada e com um filho de 2 anos, é a professora de inglês na escola onde vou trabalhar. Serei sua assistente, um quebra-galho, de segunda à sexta.
Ela é super atenciosa, sorridente e adora uma conversa – temos isso em comum. Vou morar perto da praia e perto do centro. A ideia de estar perto da praia me anima muito. Aqui tem menos internos e eu vou ser a única estrangeira neste projeto.  A barreira cultural e a dificuldade da língua me afligem um pouco, mas ao mesmo tempo vai ser uma boa poder entrar mais de cabeça nos costumes locais.
O que não falta por aqui são resquícios de terremotos.